Tuesday 6 February 2007

Prós e Contras - 1a parte

Contra os parcos argumentos do "bebé" e da "criança" e do "coração a bater às 8 semanas", a racionalidade e a calma impressionante de Rui Pereira, visivelmente emocionado e em esforço de contenção. Alguns argumentos importantes e úteis que foram apresentados: o bem jurídico que é a vida intra-uterina até às 10 semanas não é hoje protegido e a criminalização põe em causa outros bens jurídicos. As propostas de despenalização sem descriminalização não protegem o bem jurídico que é a vida intra-uterina até às 10 semanas e mantém a situação de tratar as mulheres como criminosas. Há outras formas, para além do Direito Penal, de proteger bens jurídicos. Há, claramente - e isso é respeitável "em si", mas é preciso dizê-lo com frontalidade -, uma vontade de impôr, na lei, uma moral que não é, nem de longe nem de perto, minimamente consensual. Falar em "retrocesso civilizacional" é demagogia pura.

Vera Jardim também esteve impecável, sem excitações e respondendo à letra às tentativas de deturpação do Não, recentrando o debate no que está em questão e não nas propostas "cândidas" de despenalizar mesmo que a maioria dos eleitores, numa democracia, onde está aceite que estas coisas só se mudam por referendo, votem Não. A "autoridade" que eles se reconhecem - eles, que são os "grandes defensores" da "Vida", não comparáveis ao comum eleitor que vota Não ao que está em questão - para ir contra um resultado democrático. Sem palavras.

Dispenso-me comentar as declarações sofríveis de Castro Caldas, Pinto Leite, Anacoreta Correia e Rosário Carneiro (e a excitação de Laurinda Alves). Manuel Antunes considerou que os direitos do feto são um absoluto e que há um "contínuo" na sua gestação. Claro! E não há também um contínuo na velocidade de um carro, no grau de álcool no sangue, nas notas que se tem numa disciplina? Claro que há. E é isso que impede que se imponha uma fronteira entre o que é penalizado ou não? Claro que não. Apesar de haver continuidade, havendo necessidade de uma divisão dual - permissão versus proibição - tem de ser imposta uma fronteira. Essa fronteira deve ser encontrada tendo em causa os valores em questão. Sem absolutos. Simples. Depois falou nas 160 ou 180 batidas por minuto do feto. Este apelo emocional, em jeito de argumento, de dizer "vejam lá, o coração dele até bate mais rápido que o da própria mãe!" é muito bom, sem dúvida.

Miguel Oliveira e Silva referiu um ponto fulcral, dirigindo-se a Manuel Antunes: o do valor da vida não ser um absoluto. Citou também Anselmo Borges e Frei Bento Domingues, referindo, muito bem, que tal perspectiva implicaria a revogação de algumas excepções na lei actual. Muito bem. Este argumento - de expôr as implicações de uma posição absoluta sobre a vida intra-uterina - tem de ser frisado nos próximos dias, sempre que o tema "vida" venha à baila, para que o indeciso perceba que não está a "cometer um pecado" em permitir uma excepção nas primeiras 10 semanas. Estamos em sintonia.

Quanto ao meu caro e promissor Adolfo Mesquita Nunes, que teve uma brilhante intervenção no início desta primeira parte: homem, quando é que pões esses dotes oratórios, clareza de pensamento e independência de espírito a bem de uma coisa nova, mais liberal, mais moderada e mais arejada que o teu actual (e muitíssimo bafiento) CDS-PP? Os gajos não te merecem, pá.

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