Monday, 12 February 2007
Drawing back
Um oásis
Manuel Pinheiro, n' O Cachimbo de Magritte.
Últimas notas
Materialmente vinculativo
Eleitores: 8 832 628
Abstencionistas: 4 981 015
Votantes: 3 851 613
Abstenção: 56,39%
Votantes: 3 851 613
Sim: 2 238 053
Não: 1 539 078
Votos em branco: 48 185
Votos nulos: 26 297
Quando a percentagem de votantes é inferior a 50%, existe uma condição suficiente para que possamos considerar que o referendo só pode ser materialmente vinculativo, independentemente da taxa de abstenção. Trata-se, claro, de considerar o "pior cenário" possível para o resultado vencedor que cumpra a "condição mínina" que a lei exige para que um referendo seja vinculativo. No caso deste referendo, como foi o Sim o vencedor, temos de perguntar que percentagem teria tido o Sim no "pior cenário" - se os 6.39% de votantes necessários a que o referendo fosse juridicamente vinculativo votassem todos Não. 6.39% de votantes seriam 564 404 votos. Nesse "pior cenário" possível, o Não teria obtido 2 103 482 votos, ainda assim menos que o Sim, com 2 238 053 votos. O Sim teria ganho com 51.67%.
Festejar, sim!
Friday, 9 February 2007
O último cartucho
Gostaria de deixar três breves mensagens.
Primeiro, gostaria de fazer um apelo sincero à participação de todos os eleitores
Em segundo lugar, gostaria de me dirigir aos apoiantes convictos do Sim moderado que está na mesa.
É importante que todos votem. Como há 8 anos, é previsível que o resultado final seja muito renhido. Todos os estudos indicam que existe uma menor abstenção entre aqueles que apoiam o Não. É desejável que o resultado final, consagrado nas urnas, seja um espelho tão fiel quanto possível das preferências dos portugueses. Seria uma pena se a maioria dos portugueses fosse favorável ao Sim e a maioria dos votos validamente expressos fosse favorável ao Não. É preciso votar. Ignorem-se as sondagens e deixe-se de lado qualquer sentido de vitória antecipada. Está
Finalmente, gostaria de dirigir uma palavra a todos aqueles que são favoráveis à despenalização das mulheres
É positivo que quase toda a sociedade portuguesa seja, hoje em dia, favorável à despenalização das mulheres. Mas
Há quem seja favorável à despenalização e esteja indecido em votar Sim por ser desfavorável a uma liberalização do aborto. Mas o que está em cima da mesa não é uma liberalização do aborto. Nem uma liberalização total, nem uma liberalização até às 10 semanas, como ouvimos alguns apoiantes
Todos somos pela vida e todos consideramos que a vida intra-uterina tem de ser protegida na lei de algum modo. A diferença entre o Sim e o Não reside no facto de o Sim considerar que esse prato da balança não tem um peso infinito, o que permite abrir, de forma responsável, uma excepção: numa fase precoce da sua gravidez, a mulher que encontre justificações para interromper uma gravidez, poderá fazê-lo, antes das 10 semanas, num estabelecimento autorizado. Se o Sim ganhar, o aborto continuará a ser crime durante 75% do período de gravidez e Portugal continuará a ter a terceira lei europeia que mais protege a vida intra-uterina. É difícil considerar radical este Sim.
Todos sabemos que, independentemente do que a lei diga, serão pouquíssimas as mulheres que, perante uma gravidez indesejada, alteram a sua decisão de interromper ou não essa gravidez . Ninguém nega que a lei actual é pouco ou nada eficaz. O que acontece hoje é que algumas mulheres fazem um aborto no estrangeiro, enquanto outras o fazem em Portugal, na clandestinidade. Votar Sim é contribuir para
Termino recordando os três pontos principais:
i) uma vitória do Não impedirá qualquer despenalização do aborto nos próximos 8 ou 10 anos, até que se possa realizar outro referendo;
ii) uma vitória do Sim permitirá ter uma lei mais equilibrada, que abre uma pequena excepção;
iii) uma vitória do Sim significará que teremos uma lei mais eficaz, que, de forma realista, percebendo que nenhuma mulher de facto leva a cabo uma gravidez não desejada, opta por acompanhá-la e aconselhá-la nessa difícil decisão.
Boa noite.
E, acrescento eu, depois da meia-noite de hoje, e apesar de toda a ansiedade, a calma e certeza de que, além da cruzinha no Sim, nada mais poderemos fazer. O futuro aos eleitores pertence.
Thursday, 8 February 2007
Uma excepção ponderada
Uma vitória favorável à mudança da lei significará que teremos, no plano dos princípios, uma excepção razoável e, pragmaticamente, uma excepção responsável.
Num dos pratos da balança, a defesa de uma possível vida; no outro, a escolha de interromper uma gravidez não desejada. O aborto será sempre um dilema moral.
No próximo domingo estará em causa saber se, às três excepções actualmente existentes na lei, se deve juntar uma quarta, a da interrupção da gravidez, a pedido da mulher, realizada em estabelecimento autorizado, antes das 10 semanas. Não se trata de liberalizar a IVG, mesmo que até às 10 semanas, mas de despenalizá-la e regulamentá-la. Caso o Sim vença, a posterior legislação deverá – e irá, certamente – incluir a obrigatoriedade de aconselhamento e reflexão.
Porquê as 10 semanas? Porque havendo uma escolha dual – permissão ou proibição – há que encontrar uma fronteira (como nos limites de velocidade) e porque ela deve encerrar um compromisso entre os valores em causa. Considerar o “direito a nascer” como um absoluto implica ser contra a pílula do dia seguinte e o aborto por violação. A irredutibilidade desta posição, ao atribuir um peso “infinito” a um prato da balança, torna-a pouco comum, mesmo entre o Não. Não vejo absolutos em qualquer dos lados. Encaro a gestação como um processo contínuo e gradual e considero que o estatuto da vida intra-uterina se vai aproximando do de pessoa humana à medida que ela se desenvolve – pelo que considero mais grave um aborto às 12 semanas do que às 8. É por esta razão que admito que, numa fase precoce da vida intra-uterina, o outro prato da balança possa prevalecer. É só preciso um pouco de moderação para entender isto.
Se o Sim ganhar, o aborto continuará a ser crime durante 75% do período de gravidez e Portugal continuará a ter a terceira lei europeia – em vinte e cinco – que mais valoriza a vida intra-uterina. É difícil achar radical este Sim. Uma vitória favorável à mudança da lei significará que teremos, no plano dos princípios, uma excepção razoável e, pragmaticamente, uma excepção responsável, que, sabendo que, de facto, nenhuma mulher leva a cabo uma gravidez indesejada, a procura aconselhar e acompanhar nessa pesada decisão.
Perante isto, somos convidados a engolir um ou outro sapo – o referendo, a pergunta feita, o benefício para A ou B – e a optar pelo Sim ponderado. Uma excepção é uma excepção. E tornar uma lei mais equilibrada e eficaz é uma oportunidade de ouro que não devemos desperdiçar.
Lembrar pela enésima vez
Não é com vinagre que se apanham moscas!
Como é que alguém pode vir falar na guera no Iraque ou na adopção de crianças do Sudão a menos de 48 horas do final de campanha? Vão atirar petardos para outro lado, porra. Estas declarações demonstram uma falta de respeito pela defesa da causa que nos une que é obra. Querem o quê? Subir a um poleiro e dizer de "vossa" justiça? Querem deliciar-se em apregoar uma ou outra contradição argumentativa irrelevante ou claramente contraproducente nesta altura? E como é que se publicam estas coisas? É por amiguismo? É porque o nome sugere "autoridade"? Por uma vez que seja, esqueçam os egos e as amizades e sejam pragmáticos. Repitam, serenamente, três ou quatro argumentos que importa repetir - como estes - e deixem-se de vaidades.
Wednesday, 7 February 2007
Dever cumprido
Quando se faz aquilo que se pode, faz-se aquilo que se deve.
O desplante de Marques Mendes
Não foi exactamente para isso, para que fossem "as pessoas" a decidir, e não os partidos em qualquer arranjo parlamentar que fosse, que Marcelo e Guterres avançaram com a ideia do referendo, aceite por maioria? Como é possível que agora não tenham o mínimo de vergonha na cara e, como estratégia de última hora para baralhar as pessoas, venham dizer que mesmo que o Não ganhe, avança a despenalização, porque "eles", os "iluminados", os que, vejam bem, mais defendem a vida, até acham que a despenalização pode avançar mesmo que o Não ganhe? Isto é uma eleição, meus amigos. E uma eleição em democracia é uma eleição em democracia. Isto não é Cuba. Tenham algum juizinho e respeito (democrático) pelos eleitores.
Não, obrigada. Eu voto "sim"
O Sim e o Não cristãos
Sim à despenalização
Prós e Contras - 2a e 3a partes
António Pinto Leite tem uma intervenção em que defende não só a despenalização, mas, pasme-se, também a descriminalização do aborto. Repito: a descriminalização do aborto. E vota Não? Parece um pouco contraditório. De qualquer modo, não ponho em causa a sua moderação no tema. Julgo que será um caso típico (sem ironia e sem provocação) do católico inteligente e realista que percebe que uma lei ineficaz devia ser revogada, mas que, internamente, não consegue deixar de lutar de modo a que o seu quadro de valores, profundamente religioso, prevaleça no plano penal. Fala ainda da falta de apoios do Estado à maternidade. Mas falar é fácil. Seria mais honesto propôr um aumento de impostos para estes apoios. Quer dizer, é sempre fácil queixarmo-nos do Estado quando se trata de aliviar a nossa consciência, mas quando chega a factura, esquece-se tudo.
Adolfo Mesquita Nunes, ainda muito bem, mas já algo cansado, refere que o Estado não tem de tratar de tudo, aproveitando para mencionar a acutilância do cartaz do Não sobre os impostos e a aparente contradição com tanta preocupação fiscal unilateral. Daniel Oliveira lembra que se o Não ganhar, não há possibilidade de despenalizar na Assembleia. Foi por um triz que não se lídia-ajjiorgiava, ainda bem que não falou demais! Um alívio. Marta Rebelo, numa memorável intervenção, clara e estruturada, lembra que despenalizar não é liberalizar e responde à letra a várias pessoas do Não. Responde, quer dizer, dá um K.O. a todas elas. 22 valores. Quanto a Rui Pereira, como outros já escreveram por aí, é enchê-lo de beijinhos, muitos, muitos beijinhos.
Na 3a parte: levanta-se novamente a ideia de que o aborto legalizado cresce após a legalização. Mas isto é óbvio: a "transferência" do aborto clandestino para o aborto legalizado não se dá de um dia para o outro. Não tanto pela questão de infra-estruturas, mas sobretudo pelo medo, pela vergonha social. Quantas adolescentes têm "surpresas" e fazem tudo às escondidas? Claro que o aborto legalizado cresce nos primeiros anos, na medida em que há uma deslocação da clandestinidade para a legalidade que não é imediata. Mas o aborto total não cresce. O que importa frisar é que, uma vez que nenhuma mulher de facto leva a cabo uma gravidez indesejada, qualquer aborto legalizado é um aborto a menos na clandestinidade. Um que seja já é bom.
Marta Rebelo reforça a falta de consistência do Não: o facto de não haver consenso social, de os argumentos jurídicos avançados serem de uma grande "ginástica" e de a liberalização do aborto clandestino impedir qualquer aconselhamento. Depois dirige-se a Cristas, que fica à procura dum buraco para se esconder.
Parece-me que, para o Sim, a mensagem principal a retirar deste debate é a de insistir de forma clara - e até à exaustão - que uma vitória do Não levará a uma impossibilidade de tomar medidas parlamentares de despenalização. Ah, e mais beijinhos e, se possível, uma estátua para Rui Pereira. Melhor era impossível.
Tuesday, 6 February 2007
Every little helps
A Campanha para o referendo encontra-se num momento muito importante. Encontramo-nos na recta final mas ainda dispomos de uma semana de campanha. Os nossos materiais de campanha já estão disseminados por quase todo o país. Contudo, apesar de muito trabalho voluntário, temos de momento necessidades prementes às quais temos que fazer face. Pelo exposto, fazemos um apelo à V. comparticipação com o apoio financeiro que vos for possível.
NIB 0036 - 0265 - 9910 - 0013 - 118 - 59
Com os melhores cumprimentos,
Movimento Cidadania e Responsabilidade pelo SIM
O Sim do Luís Pedro Coelho
Entre o absurdo de proibir totalmente, e o absurdo de permitir sempre, tracemos então uma linha na areia. Tracemo-la de forma cuidadosa, cautelosa. Dez semanas é cauteloso. Dez semanas é suficiente para dar tempo à mulher para decidir, mas não mais do que o necessário.
Eu aceitaria uma linha mais afastada; às 16 semanas por exemplo. O que é proposto são 10. Eu voto Sim.
Um contributo
Afinidades (5)
Já desconfiava que este post fosse causar "confusão" a alguns "liberais", numa blogosfera que (não estou a criticar, estou a constatar, as coisas são o que são e cada um é como é) onde o que mais conta são as companhias, as jantaradas, as festanças, as guerras colectivas. Quer dizer, haverá espanto por eu dizer uma coisa simples: sim, sou capaz de discutir e debater o que quer que seja com quer que seja, desde fascistas a comunistas; não, não tenho qualquer interesse, vontade, desejo de ir para os copos com pessoas que votem Não neste referendo. Não vou explicar porquê, de certeza que quem vota Sim percebe isso, ainda que tenha "requerimentos" diferentes quanto a confraternização. Mas eu não sou dado a confraternizações e não confundo amizade com mero entretenimento ou, talvez mais adequado, no micro-cosmos da blogosfera, com "networking". Não faz o meu género.
Insensibilidade social e surtos surpreendentes de consciência social e inclinação estatista
Nota: não subscreveria grande parte do resto do artigo, certamente que não a escolha de frisar que o Sim "acaba de vez com o assunto" - per se -, mas, o que é bem diferente, que ele o tira da esfera penal. Se acaso o Não ganhar, e por muito que chateie e custe, só poderemos - a seu tempo - voltar ao assunto.
Afinidades (4)
Fernando Pessoa
Uma epidemia democrática
Claro que isto não tem nada a ver com Laurinda Alves.
Afinidades (3)
Brincar com as pessoas
O Não coerente, não o Não dos 3 dês*
*doçura; demagogia; desespero.
Prós e Contras - 1a parte
Vera Jardim também esteve impecável, sem excitações e respondendo à letra às tentativas de deturpação do Não, recentrando o debate no que está em questão e não nas propostas "cândidas" de despenalizar mesmo que a maioria dos eleitores, numa democracia, onde está aceite que estas coisas só se mudam por referendo, votem Não. A "autoridade" que eles se reconhecem - eles, que são os "grandes defensores" da "Vida", não comparáveis ao comum eleitor que vota Não ao que está em questão - para ir contra um resultado democrático. Sem palavras.
Miguel Oliveira e Silva referiu um ponto fulcral, dirigindo-se a Manuel Antunes: o do valor da vida não ser um absoluto. Citou também Anselmo Borges e Frei Bento Domingues, referindo, muito bem, que tal perspectiva implicaria a revogação de algumas excepções na lei actual. Muito bem. Este argumento - de expôr as implicações de uma posição absoluta sobre a vida intra-uterina - tem de ser frisado nos próximos dias, sempre que o tema "vida" venha à baila, para que o indeciso perceba que não está a "cometer um pecado" em permitir uma excepção nas primeiras 10 semanas. Estamos em sintonia.
O "não" virtual e o "não" real
Em geral, as pessoas votam de forma diferente para defender pontos de vista diferentes. É mais raro que pessoas votem de forma diferente usando os mesmos argumentos, como acontece tantas vezes no referendo do aborto. De facto, ambos os lados reivindicam a defesa da vida e da maternidade responsável - apesar de ambos divergirem em relação àquilo que se pode chamar "os direitos do embrião".Penso porém que existe uma confusão evidente entre desejo e realidade entre os votantes do "não". Penso que entre aquilo que os votantes do "não" sonham obter e o que seriam as consequências reais do seu voto caso obtivessem a maioria existe uma diferença radical que vale a pena discutir.
Monday, 5 February 2007
Coisas simples
7 x Prós e Contras
2. Lei e Moral. É verdade que o que está primordialmente em causa é uma alteração legislativa, mas não é legítimo achar que é apenas isso que está em causa e, mais do que isso, é contraproducente fazê-lo. Fazer uma defesa demasiado absoluta de que o que está em causa é apenas a lei e não (também) a moral não convence o tipo principal de indeciso, que, digamos, "quer ir para o Céu" e fazer a escolha que algumas supostas vozes do Céu o aconselham a fazer.
3. Absoluto vs Gradação. Inevitavelmente, vai-se discutir o estatuto de feto, o que é vida humana, pessoa humana, etc. Os apoiantes do Sim têm de estar preparados para discutir isto de forma inteligente, não se refugiando na tirada "mas o que está em causa é uma alteração legislativa". É verdade, mas não é só isso que está em causa. E os indecisos, repito, num país com 80% ou 90% de pessoas que se dizem católicas e onde a ignorância grassa, são totalmente impermeáveis à ideia erudita da separação entre lei e moral. É preciso chegar a eles, é preciso ser repetitivo.
Neste ponto, importa perguntar aos apoiantes do Não se consideram que logo após a fecundação estamos perante algo que tem um estatuto equivalente ao de pessoa humana ou se existe uma gradualidade na obtenção desse estatuto. Se a resposta for que o zigoto é uma pessoa humana, é preciso dizer aos telespectadores (esqueçam os opositores no estúdio) que essas pessoas não só são contra a pílula do dia seguinte, como acham um "assassínio" usar a pílula do dia seguinte. Mais, tem alguém de dizer, olhos nos olhos, para as telespectadoras, que quem tenha tal visão absoluta será contra o aborto por violação, outro "assassínio", que devia ser punido e actualmente não é.
Se, ao invés disto, os do Não aceitarem que há uma certa gradualidade na obtenção do estatuto de pessoa humana, então, com toda a calma, deve ser frisado que, estando no outro prato da balança também um valor, é possível que, nalgum período, seja aceitável que este outro valor prevaleça. Depois, não será difícil explicar o porquê das 10 semanas. Deve ser enfatizado que o limite de 10 semanas é o mais curto em toda a Europa e que a proposta do Sim é tudo menos radical. Ver isto, isto e isto.
A ideia aqui é, em suma, a de explorar todas as implicações de considerar o "direito a nascer" como um absoluto e, em vez de desatar a rir ou a atirar-se para a cadeira em sinal de desistência, virar-se para os telespectadores e perguntar, preto no branco, e com calma, se essa implicações lhes parecem sensatas e aceitáveis. E adiantar, depois (os indecisos precisam de argumentos claramente explicados), que se não há absoluto, talvez estejamos a falar de uma excepção inteiramente razoável, dado o prazo em causa. O aborto continuará a ser crime em 75% do período de gravidez, se o Sim ganhar. Sim, o que está em causa é um Sim moderado.
4. Despenalização vs Liberalização. Está em causa despenalizar e regulamentar o aborto até às 10 semanas, não liberalizá-lo até às 10 semanas, nem muito menos liberalizá-lo "totalmente". Ver isto.
5. O amor cristão. Quem fale pelo Sim e seja cristão não deve ter medo de falar em amor, fraternidade, compreensão. Deve fazê-lo. Deve pôr a questão nos termos exactos em que Anselmo Borges e Frei Bento Domingues o fizeram, idealmente citando-os abundantemente, quer dizer, citando não apenas os nomes, mas lendo passagens dos textos magníficos por eles publicados, verdadeiros repositórios do amor cristão. Esta mensagem é importante porque os indecisos são cristãos e porque, esperançosamente, alguns deles serão sensíveis a este argumento - do equilíbrio, da moderação, da fraternidade com o próximo, ou, neste caso, com a próxima (mas sem recorrer ao argumento do "vão de escada", que os indecisos tendem a achar que as mulheres que engravidaram são umas irresponsáveis; melhor ficar pelo apoio cristão e pela compreensão). Ler isto e isto.
6. Um Não é um não. É preciso expôr a demagogia absoluta do mais recente argumento do Não, de que mesmo que exista uma vitória, expressa nas urnas, do Não, eles tomarão medidas parlamentares para despenalizar o aborto. É preciso dizer que isto representa não só um total desrespeito pela decisão democrática dos portugueses, como uma absoluta contradição interna, de quem sempre se bateu para que o assunto fosse decidido em referendo. Este ponto é muito importante, mais uma vez porque o indeciso médio "acreditará" nas boas intenções do prof. Marcelo e da sra. Sousa Franco. Não há legitimidade democrática para dizer tal coisa, que mais parece própria do regime de Fidel Castro.
Deve ainda ser acrescentado que o facto de José Sócrates ter dito que, se o Não avançar, nada poderá ser feito, não é uma "declaração estratégica", supostamente "não credível", mas uma declaração credível, na exacta medida em que é coerente com ele próprio (que sempre disse aceitar que a situação tivesse de ser referendado, uma vez que houve o primeiro referendo), mas sobretudo porque respeita a democracia e o voto dos portugueses. Mas como é que eles se atrevem a usar este argumento? É verdadeiramente inacreditável. Ler isto e isto.
7. Estado de Direito. Um estado de direito que se dê ao respeito não pode manter uma lei que ninguém cumpre. Não vale a pena invocar a ideia de que os defensores do Não quererão alterar a lei, promovendo a despenalização, porque, como refiro no ponto anterior, não têm legitimidade para o fazer se o Não ganhar. Sobre a questão do estado de direito e das leis, leia-se - e cite-se - o que escreveu o ex-bastonário da OdA José Miguel Júdice.
Notas finais: não esquecer de tomar calmantes, não responder às diabruras do Não, falar sempre para os indecisos que estão em casa e que acham o aborto uma "coisa má" (óbvio, todos achamos) e que não querem "ir para o Inferno por votar Sim no referendo". Só isso é que interessa hoje à noite.
Good luck.
O amor, sempre
Do voto cristão no dia 11-02-2007
Querem um exemplo fora do tema do aborto? Johnny Cash, na sua vida toda e, de forma particularmente nítica e tocante no seu mítico concerto ao vivo At St. Quentin. Mais do que as músicas, é a forma como ele dialoga, aceita (recebe?) e verdadeiramente ama os prisioneiros que o escutam, com uma alegria imensa que contagia qualquer um - os músicos, os prisioneiros, até os guardas, e nós que o podemos testemunhar até sempre. É a forma como ele pratica o amor cristão, a forma como ele acredita e se dedica, com devoção, à redenção terrena dos prisioneiros e (através disso) dele próprio, redenção essa que ele considerará como parcial - por ser terrena -, mas ainda assim importante.
O cristão, para mim (repito, se me permitem ter uma leitura...), é essencialmente alguém que nunca desiste de compreender o outro; de o trazer, após um comportamento censurável, de volta ao que é desejável, mas sempre com uma mão amiga, não com pedras ou chicotes. Um cristão terá sempre os braços abertos para uma mulher que passou pelo dilema e sofrimento de fazer um aborto. Um cristão saberá sempre que uma mulher faz um aborto cheia de dúvidas, cheia de medo, cheia de lágrimas. Um cristão, ao inquirir uma mulher sobre a razão de ter feito um aborto, poderia dizer "Porque pecaste, irmã? Porque tiveste de pecar? O que se passa na tua vida, o que se passa na tua alma, para o teres feito?"; nas nunca a apelidaria de "assassina". Nunca, mas nunca, sugeriria que ela, criatura divina como o homem, responsável como o homem, teria tomado uma decisão tão pesada de ânimo leve, "sem qualquer justificação".
Se Cristo votasse no referendo de dia 11, acredito que optaria pela compreensão e pela moderação - votando Sim ao que está na mesa. Votando por um Sim que é incontornavelmente ponderado. E julgo que não apreciaria muito do que se tem visto por aí, de incompreensão, de guerra suja, de desconsideração pela próxima. Não lhes atiraria pedras, mas não deixaria de perguntar: "Porque atiras pedras, irmão? Porque tratas as tuas irmãs dessa forma? Tens ódio dentro de ti?". E certamente que os tentaria trazer à razão. O que em linguagem cristã quer dizer que os tentaria trazer de volta ao amor puro e incondicional.
Nota: só para não haver qualquer mal entendido: não estou a mostrar qualquer cartão amarelo ou vermelho a alguém que se considere cristão e vote Não. Falo apenas da minha leitura da essência da mensagem de Cristo, aplicada à situação em concreto do referendo do próximo Domingo. Passo com muito gosto (e apenas por ter nisso alguma autoridade) cartões vermelhos sobre lógica argumentativa em qualquer debate, não tenho pretensões nenhumas de oferecer uma interpretação definitiva do que é ser cristão. Isso seria ridículo. Dou apenas uma opinião.
Afinidades (2)
De como alguns ilustres defensores do Não respeitam o voto de cada português
PS: leia-se também isto.
Coerência
Mas, caro Tiago Geraldo, acaso tens a certeza que um feto com Trissomia 21 tem capacidade para enfiar o dedo na boca - e chupar - às 10 semanas? Vê lá, confirma isso, senão arriscas-te a que te acusem de deturpação de alguns critérios - rigorosamente corroborados pela ciência - que algumas pessoas do Não apresentaram como definidores do que é uma "pessoa humana". É que se te apanham em falso, és tu que ficas a chuchar no dedo.
Do proselitismo
Palavras trocadas
O vale-tudo dominical
A propósito, como é que estão cotados, na categoria de humor, os últimos vídeos do professor? Ou os últimos já não são humor? Marcelo deve explicar, que o povo, coitado, não vai lá sozinho.
Sunday, 4 February 2007
Nada está decidido
Leia-se o artigo todo de Pedro Magalhães. (via João Pinto e Castro). Será bom não esquecer isto amanhã no Prós e Contras.
Lúcido e honesto
Ser enfocado, ser responsável
E necessitamos também de recordar por que é tão importante votar Sim.
[João Pinto e Castro]
Despenalização vs Liberalização
[Bruno: acho que isto responde ao teu post de forma suficiente.]
Um problema - hoje - de dimensão política
Guterres e Marcelo
Assim, não, caro professor.
3 x Vale Tudo
Ribeiro e Castro: É. (Pausa) Hããã... pode não ter consciência disso, eu acredito que não tenha consciência disso.
Por opção da mulher
1. Estava já nas últimas páginas da tese e doutoramento de Vítor Coutinho, defendida na Universidade de Münster (Alemanha) - que investiga o paradigma da fecunda interacção entre Bioética e Teologia, terminando com o elogio da interrogação (1) -, quando fui surpreendido com as respostas ao inquérito do DN (30/01/2007): "Concorda ou não que, na defesa dos seus princípios, a Igreja Católica se envolva directamente na campanha do referendo?" Cinquenta e oito por cento rejeita o envolvimento da Igreja e trinta e quatro por cento apoia a sua intervenção.
Donde virá tanta alergia à intervenção da Igreja Católica, identificada abusivamente com a hierarquia?
Circula, há muito, a opinião de que a Igreja tem uma resposta dogmática, irreformável, para todos os problemas sem se preocupar com as perguntas e com os dramas das pessoas, sobretudo no campo da ética sexual. Ainda agora, na carta aos párocos e paroquianos da diocese de Lisboa sobre o referendo, o cardeal-patriarca expressa, logo no primeiro ponto, uma norma que, segundo alguns, não deixa espaço para o esclarecimento e para a liberdade de consciência: "A doutrina da Igreja sobre a vida, inviolável desde o seu primeiro momento, obriga em consciência todos os católicos. Estes, para serem fiéis a Igreja, não devem tomar posições públicas contrárias ao seu Magistério. O esclarecimento que os católicos são chamados a fazer sobre esta questão tem de ter em conta também os critérios de fidelidade à Igreja."
Os problemas de consciência nem sempre foram resolvidos desta maneira. Nem é preciso recuar até S. Tomás de Aquino. Joseph Ratzinger, hoje Bento XVI, quando era professor de Tubinga, escreveu um texto, pouco antes da Humanae Vitae (1968), que Hans Küng, seu colega e amigo, transcreve, agora, nas suas Memórias. Só posso deixar, aqui, um fragmento: "Acima do papa, como expressão da autoridade eclesial, existe ainda a consciência de cada um, à qual é preciso obedecer antes de tudo e, no limite, mesmo contra as pretensões das autoridades da Igreja."
Dir-se-á que o prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé e actual Papa já teve práticas pouco conformes a esta sua luminosa afirmação. Mas não podemos ignorar que, de modos diferentes, toda a Igreja é docente e discente. Esta interacção é, muitas vezes, esquecida para se pensar, apenas, na palavra da hierarquia e na dos leigos que a reproduzem.
2. A corrente laicista, que deseja a Igreja fechada na sacristia, não creio que seja maioritária na sociedade portuguesa, apesar do nosso passado anticlerical. Mas a grande alergia à presença activa da Igreja talvez resulte da ideia de que ela quer fazer da sociedade e do espaço público uma sacristia. As declarações e posições pouco católicas de certos movimentos, personalidades e de alguns padres dão a impressão de quererem entregar à repressão do Estado, do Código Penal, dos tribunais, da polícia, da cadeia, as suas convicções morais - isto é, parece que não confiam na consciência das mulheres, na sua capacidade de discernimento, para percorrerem todos os caminhos necessários até chegarem a uma decisão bem informada, responsável, prudencial, no sentido que a virtude da prudência, virtude da decisão bem informada, tem em Aristóteles e Tomás de Aquino.
Ora, como escreveu o prof. Vital Moreira, "quando se fala em "despenalização" de certa conduta, tanto no discurso leigo como na linguagem jurídico-penal, o que se pretende é retirá-la do âmbito do direito penal e do Código Penal, ou seja, da esfera dos crimes e das respectivas penas. (...) Só a legalização proporcionará condições para fazer acompanhar a decisão de abortar de um mecanismo obrigatório de reflexão da mulher que o pretenda fazer" (2). E nunca se deve confundir o que é legal com o que é moral.
Como dizia Tomás de Aquino, só somos verdadeiramente livres quando evitamos o mal, porque é mal, e fazemos o bem, porque é bem, não porque está proibido ou mandado. Todo o trabalho que a Igreja tem a fazer é, precisamente, o de ajudar as pessoas a caminharem para esse ponto de lucidez. Esclarecer as consciências não é formatá-las, não é impor-lhes uma outra consciência, não é aliená-las. Quando, nas condições e no prazo referidos, se chama "assassinas" às mulheres que recorrem ao aborto - que a Igreja e qualquer pessoa de bom senso desejam que nunca venha a acontecer -, pode estar-se a insultar, exactamente, as que sofrem os dramas que acompanham essas decisões dolorosas. A resposta ao referendo não deve extravasar o âmbito da pergunta aprovada.
3. Em última análise, a grande suspeita em relação à pergunta do referendo está neste fragmento da frase: "por opção da mulher." E porquê? Porque se julga que as mulheres não são de confiança. No entanto, foi a elas que a natureza confiou a concepção e o desenvolvimento da vida humana, durante nove meses.Para os cristãos, esta desconfiança em relação às mulheres deveria ser insuportável. Não se lê, no Novo Testamento, que a Incarnação redentora ficou para sempre dependente da decisão de uma mulher, Maria de Nazaré (Lc l, 26-38)? Não foram as mulheres - e, segundo a cultura do tempo, não podiam testemunhar em tribunal - que são apresentadas, nos seus textos fundadores, como as grandes testemunhas do processo de Jesus? Não foram elas que testemunharam que Ele estava vivo, quando os Apóstolos já tinham concluído que estava tudo acabado? Não foi Maria Madalena a escolhida, por Jesus ressuscitado, para evangelizar os Apóstolos, para os convocar para a missão (3)?
É certo que os homens, logo que puderam, as subalternizaram. E, até hoje, por serem mulheres, estão, à partida, excluídas de serem chamadas para os ministérios na Igreja.
No debate sobre o referendo, receio que a Igreja - ao não dar sinais claros de respeito pelo pluralismo no seu interior - perca, uma vez mais, a ocasião de se manifestar verdadeiramente católica.
Saturday, 3 February 2007
Destrunfar o Não (4)
Destrunfar o Não (3)
Não tenho dúvidas que, com as economias de escala que existem nos hospitais, o aborto será sempre muito mais barato do que é actualmente na clandestinidade. Logo, a mulher preferiria sempre o aborto não clandestino, por ser mais seguro e mais barato. Há alguns pessimistas que dizem, com alguma razão, que a clandestinidade continuará porque as mulheres têm "vergonha", etc., etc.. Pois é, amigos, essa vergonha, todo o estigma social associado à prática do aborto (mais que compreensível, diga-se) não muda da noite para o dia. Acontece que aprovar uma lei que despenalize o aborto em certo período é o primeiro passo para que a médio e longo prazo isso deixe de ser assim. O primeiro passo, caros amigos. Deixem lá as contruções teóricas e as situações ideias, cheias de perfeição institucional e formal e assentem os pezinhos no chão. The real world is down here.
Destrunfar o Não (2)
Tem de terminar a demagogia de dizer que se o Sim ganhar estaremos perante uma "liberalização" do aborto. O aborto não será livre, mas regulamentado. O aborto não será "a pedido", mas "condicionado à aceitação de um pedido".