Embora este argumento não pretenda ser definitivo, porque a questão é complexa, julgo difícil aceitar que não se penalize a mulher, que é sem dúvida autora moral do acto abortivo - e, eventualmente, também material -, enquanto que quem é meramente autor material desse mesmo acto - quem "fornece o serviço", ajuda nos contactos, etc - é penalizado.
Será aceitável que o autor material seja mais penalizado que o autor moral de um acto? Não creio. (Isto não é apenas perguntar se a actual lei consagra esse princípio, é sobretudo perguntar se esse princípio é justo ou não - isto para alguns juristas-legalistas que têm uma tendência vigorosa para tomar a lei que existe como sendo possuidora de uma sacralidade [ética] incontestável, quase sobre-humana, o que é redutor e perigoso, para não dizer verdadeiramente absurdo).
Será aceitável que o autor material seja mais penalizado que o autor moral de um acto? Não creio. (Isto não é apenas perguntar se a actual lei consagra esse princípio, é sobretudo perguntar se esse princípio é justo ou não - isto para alguns juristas-legalistas que têm uma tendência vigorosa para tomar a lei que existe como sendo possuidora de uma sacralidade [ética] incontestável, quase sobre-humana, o que é redutor e perigoso, para não dizer verdadeiramente absurdo).
Aquilo que gostava que algumas, perdão, imensas vozes do Não no referendo - aquelas que, numa estratégia incontestavelmente muito inteligente, insistem em afirmar que são pela despenalização da mulher (sem nada ter feito por isso quando o PSD-CDS/PP estavam no poder, como muito bem afirma, com especial autoridade, Vasco Rato) - respondessem é se concordam com a despenalização de quem quer que esteja envolvido no acto abortivo, ou seja, dos seus autores materias e eventuais cúmplices (quem dá os contactos, etc).
Há um argumento comum em alguma esquerda, mas que também é visível nalguma direita e em apoiantes do Não, mesmo libertários em termos económicos, que condena o lucro obtido no negócio do aborto clandestino. Como tentarei argumentar amanhã, apenas uma parcela pequena desse lucro pode ser, pelo menos duma perspectiva liberal (que é a minha), considerado ilegítimo. A ideia global e generalista de que o todo o lucro é ilegítimo é falaciosa para qualquer espírito minimamente liberal.
Leia-se ainda o que escreveu Pedro Marques Lopes.
3 comments:
"aquelas que, numa estratégia incontestavelmente muito inteligente, insistem em afirmar que são contra a despenalização da mulher "
Era mesmo isto que o Tiago queria escrever?
A minha dúvida não era acerca do "inteligente" - era mesmo se o TM não terá trocado um "contra" por um "pelo" (ou um "despenalização" por "penalização")
Claro, stupid me. Já corrigi o lapso. Tx.
Post a Comment