Thursday 25 January 2007

A Lógica do meu Sim (1)

1. Há um dilema moral na questão do aborto, devido aos dois valores em conflito: o de uma vida humana, que é, no mínimo, uma pessoa "em potência"; e o da liberdade da mulher. Julgo que o Estado deve estar fora do assunto;

2. Dado o Estado ter hoje uma palavra a dizer sobre o assunto, inclino-me, naturalmente - e em abstracto - para que essa situação seja reparada;

3. Ora, essa situação só pode ser reparada com medidas concretas. No caso, o que temos na mesa é um referendo. Concordermos ou não que a questão deva ir a referendo, concordemos ou não que ela é a melhor pergunta que poderíamos ter feito, é o que temos na mesa. Há que avaliar não a situação actual face à situação (que temos por) ideal, mas a situação actual face à situação possível. Claro que na avaliação da situação possível podemos, perfeitamente, ter em conta o quão longe ela está da situação ideal. Não me parece é que possamos ter apenas isso em conta. Não podemos ignorar o que está em cima da mesa e dizer que só por não ser a situação ideal, voto Não ou opto pela Abstenção. Isso implicaria, das duas (pelo menos) uma: i) uma Falácia de Falso Dilema ("ou sim ou sopas"); ou achar que desde que não estejamos na situação ideal, tudo o que seja proposto me é indiferente, independentemente do quão longe isso esteja da situação ideal;

4. Para mim, a pergunta e o que a ela subjaz está longe do ideal e há coisas com que discordo com o que pode vir a acontecer se o Sim ganhar - e não é demais lembrar que há muita coisa em aberto. Mas, tudo bem medido, considero que todas essas coisas que não colhem o meu favor, quando comparadas com a necessidade - devido a uma questão de princípio - de retirada do Estado neste assunto, se tornam perfeitamente ultrapassáveis.

Logo, só posso votar Sim. Logicamente, voto Sim.

A seu tempo explorarei cada um destes quatro pontos.

1 comment:

Duarte Meira said...

Só há dilema se temos valências opostas no mesmo plano axiológico e não há hierarquização de valores. Neste caso, a hierarquização é clara: o valor-vida é primacial sobre o valor-liberdade, quando mesmo esta fosse certa, o que está longe de ser o caso neste tipo de "opções".

Por outro lado, se o que o aborto faz é o homicídio de uma vida humana sem culpa e indefesa, por que é que o Estado deve estar afastado do aborto e não se afastar também de penalizar as outras espécies de homicídio?